quarta-feira, 21 de março de 2012

Desabafo de um professor PSS que não recebeu o salário


Assumi aulas no dia 1 de fevereiro. Pela primeira vez em vários anos, o governo consegue cumprir com a promessa de iniciar o ano letivo com o quadro de professores completo nas escolas estaduais (embora o quadro de profissionais tenha demorado algumas semanas para se normalizar). Como os suprimentos que ocorrem até o dia 10 de cada mês (aproximadamente) são incluídos na folha de pagamento para o final do próprio mês, fiquei tranquilo com a possibilidade de, pela primeira vez no PSS, receber o primeiro salário do ano no final de fevereiro. Mas na terceira semana de fevereiro, recebo uma notícia que me deixou sem chão: meu salário não viria em fevereiro. Fiquei pasmo e completamente atordoado com a notícia, pois logo que assumi aulas acabei me tranquilizando com relação ao meu pagamento, e no meio do mês, tenho uma notícia terrível, que me obrigou a avisar na imobiliária que o aluguel poderia atrasar, liguei na loja de calçados avisando a mesma coisa, enfim, fui avisando credor por credor sobre a possibilidade de atrasos nos pagamentos de minhas obrigações. A imobiliária disse que eu seria multado em 10% do valor do aluguel, a loja de calçados disse que seguraria a dívida por 10 dias, e assim foi acontecendo a cada credor que eu contatava. 

No dia 29 de fevereiro, soube de uma notícia que me deixou um pouco aliviado: meu pagamento chegaria dia 14 de março. Dessa vez, passei a avisar todos os credores que eu pagaria minhas contas no dia 14 e que, se fosse possível, segurassem o prazo de vencimento das dívidas até o dia 14. A maioria concordou, exceto a imobiliária, que por sinal, manteve a multa. Não foi nada bom saber que eu ficaria 14 dias com as contas atrasadas, mas como eu havia feito um empréstimo no banco, fiquei um pouco mais tranqüilo, pois o dinheiro iria dar para passar mais duas semanas, de um jeito bem sofrido (não como carne à quase um mês porque é caro!) mas, razoável. 

Só que ocorreu algo terrível. Dia 14 meu salário não caiu na minha conta. Como já eram 6 horas da tarde quando cheguei da escola onde trabalho à tarde, não deu tempo de verificar se havia caído em ordem de pagamento. Dia 15 eu era um dos primeiros da fila no banco. Não havia dinheiro para mim em ordem de pagamento também... Fui correndo ao Núcleo Regional de Educação e, ao chegar lá, ouvi a bomba: meu salário não foi depositado. Fui às lágrimas. Não consegui conter o choro. Tanto sofrimento por causa do dinheiro para que, no dia tão esperado de pagar as contas e voltar à normalidade, não ter nada em mãos. Foi um balde de água fria. 

Professor não vive de sonhos e não trabalha só por amor. Professor tem contas a pagar, tem credores batendo à sua porta. E um dia de atraso já significa MULTA. Meu aluguel só não está atrasado porque peguei mais um empréstimo. Mas só o suficiente para pagar essas contas. Mas paguei as contas criando outra, com uma taxa de juros altíssima. Gostaria de ver o governo cobrindo os juros da minha dívida. Pois a culpa é dele: trabalhando a 50 dias sem receber. E vou passar o resto do ano pagando a dívida desse fatídico começo de ano. Não me entra na cabeça como os suprimentos não puderam ser feitos a tempo: os professores têm que dar seus pulos para elaborar suas aulas a tempo, para corrigir as provas a tempo, lançar notas a tempo (porque a Hora-atividade de 20% não é suficiente, mas deixo esse assunto para outra oportunidade). Mas o RH pode fazer tudo a seu tempo... Eu realmente não consigo entender como o governo deixou isso acontecer. Se fosse por falta de pessoal, remanejasse funcionários para atender a demanda. Mas sinto muito, falta de tempo não é desculpa. 

Eu cheguei a mendigar moedas nas escolas onde trabalho para poder pagar o ônibus para voltar para casa depois da aula. Isso é dignidade? Cadê o respeito ao professor? E isso não se aplica somente ao Governo. O sindicato tem um fundo de greve, onde há recursos para suprir a falta de pagamento de professores em situações de greve. Não estamos em greve, mas parece que o setor de RH do governo está. O sindicato deveria suprir o pagamento dos professores em uma situação como essa também. Mas, isso nem passou pela cabeça do sindicato, infelizmente. Enquanto isso, os professores estão se afundando em dívida, e o sindicato não faz nada além de conversar com o secretário da educação. Eu estou triste, magoado, mas, acima de tudo, revoltado. 

Para terminar, suplico ao governo: se não vão conseguir cumprir uma promessa, não prometam! Não criem expectativas nas pessoas para depois dar-lhes banhos de água fria.